terça-feira, 24 de março de 2009

Preservar o João Leite

Barragem do Ribeirão Leite



Neste artigo a promotora Marta Moriya Loyola, do Ministério Público Estadual, comenta a realização de audiência pública convocada pela Saneago para discutir os impactos ambientais da barragem do Ribeirão João Leite.

"Durante a audiência pública da Saneago, manifestou-se a preocupação acerca de empreendimento denominado Goiânia - 3º Milênio, que propõe macrozoneamento ambiental e turístico da bacia, indicando ainda a possibilidade de implantação do novo Parque Agropecuário de Goiânia e do novo zoológico em área rural do município de Goiânia, próxima ao Parque Estadual Altamiro de Moura Pacheco".



Preservar o João Leite
Marta Moriya Loyola – O Popular – 27/12/08


Realizou-se, no dia 3/12/08, audiência pública convocada pela Saneago, com a finalidade de discutir os impactos ambientais relacionados à barragem do Ribeirão João Leite, que tem previsão de fechamento de comportas para março de 2009. Compareceram ao auditório do Ministério Público representantes de diversos segmentos da sociedade, o que deixa evidente a preocupação de todos com o futuro do sistema que vai garantir o abastecimento de água de Goiânia nos próximos anos.

O Ministério Público, considerando a questão prioritária e urgente, determinou à sua equipe de peritos ambientais a realização de um estudo técnico com a finalidade de diagnosticar a atual situação ambiental da Bacia do João Leite e mapear os empreendimentos possíveis na bacia, que não comprometessem a qualidade e quantidade de água do reservatório, porquanto se trata da água que vai ser consumida por cerca de 1,5 milhão de pessoas.

As conclusões do estudo foram, no mínimo, preocupantes.

A equipe técnica do Ministério Público preocupou-se em investigar a qualidade da água bruta na bacia e, analisando dados de análises físico-químicas e bacteriológicas realizadas no período de janeiro de 2007 a agosto de 2008, constatou que o Ribeirão João Leite, de acordo com resoluções que regem a matéria (Conama 274/2000), não apresenta sequer condições de balneabilidade, ou seja, seria imprópria até para banhos (recreação de contato primário), por apresentar índices inadequados de fósforo e Escherichia coli.

Referidos índices seriam resultantes da contaminação da água por diversos fatores, tais como: uso indiscriminado e descontrolado de agrotóxicos e fertilizantes (que são carreados aos cursos d’água), lançamento clandestino de esgotos domésticos e industriais e destruição de áreas de preservação permanente.

Outro aspecto relevante, detectado pela perícia, refere-se à grande suscetibilidade do solo da bacia do Ribeirão João Leite a processos erosivos. Como é sabido, a atividade humana é um fator que desencadeia e acelera processos erosivos, seja pela eliminação da vegetação nativa, seja pelo uso de práticas agrícolas inadequadas. Assim, imprescindível que qualquer empreendimento na Área de Preservação Permanente (APA) do João Leite seja precedido de minuciosa avaliação prévia de impacto ambiental, assim como se deve exigir a adequação ambiental das ocupações ali já existentes como, por exemplo, a implementação de sistema de esgotamento sanitário e estação de tratamento de esgoto em todos os municípios que compõem a bacia, implementação de aterros sanitários efetivos, bem como planos de gerenciamento integrado de resíduos sólidos e projetos de recuperação de áreas de preservação permanente objetos de processos erosivos.

Durante a audiência pública da Saneago, manifestou-se a preocupação acerca de empreendimento denominado Goiânia - 3º Milênio, que propõe macrozoneamento ambiental e turístico da bacia, indicando ainda a possibilidade de implantação do novo Parque Agropecuário de Goiânia e do novo zoológico em área rural do município de Goiânia, próxima ao Parque Estadual Altamiro de Moura Pacheco.

A preocupação dos órgãos ambientais e de segmentos da sociedade que têm se manifestado contrariamente ao empreendimento é pertinente, porquanto se trata da ocupação de área contígua ao reservatório que vai abastecer o município de Goiânia. De fato, o projeto merece acompanhamento e deverá obrigatoriamente se adequar à legislação restritiva à ocupação da APA. Todavia, a preocupação dos órgãos ambientais e da Saneago não pode, de modo algum, se resumir a isso, tendo em vista que o estudo demonstrou que a água que formará o reservatório em futuro próximo já está sendo contaminada, ao longo de seu curso, pelas mais diversas fontes poluidoras.


Conquanto se saiba que a tecnologia hoje torna possível o tratamento de água bruta de qualquer qualidade, tornando-a potável, os custos do tratamento e, sobretudo, a preocupação ambiental em despoluir os nossos mananciais devem nortear as nossas ações visando à recuperação do que já está degradado e à prevenção de futuras degradações, englobando toda a bacia hidrográfica, valendo-se de atuação preventiva, repressiva, e implementação de mecanismos criativos de fiscalização e controle ambiental já utilizados em outras regiões.


Marta Moriya Loyola é promotora de Justiça e atua na 15ª Promotoria de Goiânia, especializada na defesa do meio ambiente – O Popular – 27/12/08



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